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Thiane Ávila

Autor: Thiane Ávila

A luz de uma estrela

29/10/2019 - Sorocaba - SP

A metade de todos os dias se resolve à medida que você faz o que ama. Os caminhos acariciam os pés quando estão cansados, e a colheita falha é sempre mais um motivo para aperfeiçoar o que, no processo, ainda não está bom.

A metade de todas as horas anda bem à medida que você respeita o seu tempo. Os desafios tornam-se motivo para crescer, e o parâmetro mais lindo a ser usado como comparação é o que você foi ontem. Ou há poucas horas. Enternecer a espera significa entender que a atitude não prescinde pressa, mas também que a esperança sem ação é uma cobiça digna de acomodados.

A metade de todas as noites se resolve à medida que você aprende a fixar os olhos nas estrelas. Um único momento com os olhos enredados em uma estrela é capaz de unificar o brilho que parece estar direcionado única e exclusivamente para você. Trata-se da lição de posicionar as próprias valências nos enredos da própria história, contando os detalhes à medida que os versos se desenham.

A metade de uma poesia se resolve à medida que você desconecta a cabeça da responsabilidade sobre a lógica. O eufemismo do poeta circunscreve a devassidão de um mundo com as emoções à flor da pele, mas convencido de que consegue disfarçar os próprios descaminhos. Costumo dizer que a loucura é um privilégio da arte. Ela dá o subsídio de que precisamos para sair do roteiro e dos padrões, recriando, a cada nova vontade de novidade, os significados mais sublimes das abstrações terceiras.

A metade da memória se resolve à medida que entendemos como viver o presente. É, de fato, assustador deparar-se com uma sociedade despreocupada com a história e com as orquestras dos contextos. Uma hermenêutica sem profundidade sobre os antros das saudades sem repertório. Embora nunca tenhamos a garantia das permanências, está certo aquele que entendeu que a única coisa capaz de permanecer é o instante pontual das coisas que, tão logo, vão passando.

A metade das emoções se resolve à medida que perdemos a pretensão de liquidar o que sentimos. Como em uma peça de teatro, na vida, você é o protagonista de uma peça improvisada, daquelas que contam, no máximo, com um roteiro semi-estruturado. Não há garantias ou promessas. A grande verdade é que o futuro está sempre nos olhando a sorrir. Quando pararmos de atribuir as responsabilidade às coisas, entenderemos que a direção sempre esteve em nossas mãos. 

Sobre as outras metades que resolvem as coisas, essas estão sempre pairando sobre nossas reações. Entender a dinâmica é a metade mais importante para reagir aos outros cinquenta por cento que não estão depositados na nossa conta. Como escritora, entendo bem de estímulos e provocações. Ao começar a escrever, resolvi metade do meu texto. A outra metade é sempre um mistério.

 

THIANE ÁVILA.

 

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